Tenho espirito de viajante…gosto de ir, apenas ir! Durante
muito tempo quis perceber estas duas forças que existiam em mim: a necessidade
premente de partir e o apego a tudo aquilo que era ‘desculpa’ para ficar. Era
como se houvesse em mim duas pessoas.
Não sei se acreditam em vidas passadas. Eu acredito.
Acredito que a vida que tenho em mim não se esgota aqui, neste lugar, neste
espaço de tempo que me foi decretado. Um dia disseram-me que, em outra vida,
fui viajante, daquelas que ía e não sabia quando voltava, das que não criam
raízes em lado nenhum, das que não se prendem, das que não se apegam, das que
não temem as despedidas… esse era o meu Karma, arranjar o equilíbrio entre o
partir e o ficar, entre o apego e o desapego.
Há dois tipos de viajantes: os que viajam por agência, com
tudo marcado, roteiros traçados, guia turístico, grupos…se algo correr mal,
pede-se indemnização á agência, culpa-se o guia, diz-se que o que valeu foi a
companhia e não se volta a repetir o destino.
Depois há os outros…os que vão ‘sem rede’, apenas com um
destino definido mas sem guia, sem nada programado. Vão sentir, explorar,
deixar-se levar pelo momento, aproveitar cada surpresa da viagem, aprender. Se
algo correr mal, não há culpados, não se pedem indeminizações e , na maior parte
das vezes, volta-se a repetir o destino, fazendo a viagem por outro caminho.
Fiz muitas viagens ao longo da vida, vinha de todas elas
cheia, preenchida, com sede de mais, com planos para a próxima…
Achava que a viagem da minha vida ía ser á India. Estava a
preparar-me psicologicamente para a fazer. Era, provavelmente, a viagem que me
mudaria como ser humano, que me faria mudar a perspectiva de tudo. Ainda não
fui á India. Descobri que a viagem da minha vida não era a outro país, a outra
cultura, a outra realidade…a viagem da minha vida estava tão mais perto, estava
dentro de mim! Para a viagem á Índia posso preparar-me, escolher o momento
certo, fazer o que sempre fiz melhor: planear! Para esta viagem, a que um dia
decidi fazer dentro de mim, não há planos que resultem, mapas que me guiem,
datas escolhidas! Viajarmos ao mais fundo de nós mesmos é uma viagem solitária,
muitas vezes desconfortável, outras tantas dolorosa. Os caminhos são difíceis,
a paisagem ás vezes assusta, o silêncio consegue ser aterrador…talvez por isso,
esta seja ‘a’ viagem da minha vida!
Sempre ouvi de todos: ‘tu és forte, tu és uma lutadora, tu
és um exemplo…’ Convenci-me que tinha de ser assim, aprendi a ‘fugir para a
frente’ como ninguém. Não me detinha nos problemas, não fazia o ‘luto’, não os
explorava… seguia, como dizem que fiz um dia em outra vida. Seguia porque era
isso que eu sabia fazer melhor: ir! Ir em frente e levar na bagagem todos os
que amava, todos os que precisavam de mim, todos os que eu não podia
desapontar!
Não deixei de ter este espirito de ir, não deixei de ser
viajante mas, hoje recuso-me a fugir das viagens a sós, hoje recuso-me a seguir
sem perceber, dentro de mim, qual é o caminho. O que mais me custa? O silêncio…
Viajar sozinho é sair da nossa zona de conforto. Não é para
todos, não é compreendido por todos, nem todos nasceram com espirito de
viajante. O que existe dentro de mim pode ser maior do que o mundo lá fora,
pode ensinar-me mais do que uma viagem á India, pode guiar-me mais do que os
mapas que foram traçados por outros. Aqui, nesta viagem, vou descobrir o melhor
de mim, vou aceitar o que sou, vou perceber o que é importante, vou deixar de
fugir porque é isso que ‘os fortes e lutadores’ fazem. Não é qualquer pessoa
que conseguirá fazer uma viagem destas comigo, ir com fé, sem destino, dar-me a
mão e perder os medos, confiar, partilhar os silêncios. Já ouvi algumas vezes:
‘não te consigo acompanhar’…não faz mal, seguirei sozinha, porque nem todos na
vida nascem com a mesma missão, com a mesma ambição, com o mesmo Karma…nem
todos nascem viajantes!
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