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segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Carta ao medo

 
Olá, já nos conhecemos lembras-te? Eu era criança quando nos vimos pela 1a vez. Não gostei de ti! Desculpa a frontalidade mas achei-te intrometido, convencido, chato! Estivemos juntos muitas vezes no meu quarto, no meu 1º dia de escola, quando mudei de casa e de cidade, quando entrei na nova escola e tive de fazer novos amigos...estavas lá mas como eu não gostava de ti, ignorava-te e acabavas por ir embora. Estávamos longos períodos sem nos ver...e que bom que era não ter noticias tuas!
Voltaste a aparecer muito mais tarde, ainda mais convencido, mais seguro de ti...lembro que entraste comigo naquele quarto de hospital quando tudo o que eu queria era ficar sozinha com a minha dor! Mas não, a partir desse dia não mais me largaste e, quando eu julguei ter perdido tudo, ter perdido todos, tu fizeste questão de ficar! E ficaste...
E é curioso que quando algo está tão presente na nossa vida deixa quase de se sentir, de se ver...torna-se uma sombra de nós e aprendemos a andar com ela sem olhar para trás!
Para não te ver fiz algo que aprendi logo em criança, talvez em desenhos animados, talvez em algum dos livros onde aprendi a ler ainda antes de ir para a escola: pus a minha capa dos super poderes! Debaixo dela não me conseguias tocar, debaixo dela ninguém conseguia ver a tua sombra, debaixo dela tu não existias! Mas, ás vezes e com tanto uso, a capa rasgava-se, começava a ficar gasta, tinha de ser remendada. E, nesses momentos em que a tirava lá estavas tu, a olhar para mim, a mostrar-me a tua força, a tua imponência! Continuavas o mesmo: prepotente, intrometido, chato! E eu continuava a odiar-te e a querer que desaparecesses da minha vida!
Um dia, assim do nada, desmaiei. Caí redonda no meio do chão! Quando acordei não sabia da minha capa...fui 'despida' para o hospital! Quiseste acompanhar-me... pela 1ª vez fiz-te frente e não deixei! Não, não tinha a minha capa mas também não precisava dela! Caramba, aos 36 anos estava mais do que na altura de me despedir de ti! Devia ter batido com a cabeça...
Sem a minha capa sentia-me frágil, perdi os super poderes, já não era a mulher destemida, que aguenta tudo, que estava protegida de ti... do medo!
Decidi pedir ajuda a alguém...encontrei uma costureira que me fez uma nova, uma ainda mais especial, mais personalizada, á minha medida! E sabes que capa é essa? A minha pele. Sabes como se ganham super poderes? Vestindo a nossa essência, conhecendo as nossas vulnerabilidades e enfrentando-as.
Desde esse dia, todos os dias me olho ao espelho com orgulho na minha pele! Desde esse dia ainda me procuras várias vezes, ainda tentas voltar á minha vida, impor a tua presença mas, desde esse dia decidi ser feliz! E sabes? Se não te tivesse conhecido nunca teria sabido como é bom viver sem ti...porque és um chato, um prepotente, um intrometido e por isso digo-te: Adeus!

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